A Tradição Platônica.
A idéia de transcendência, de que
existe algo capaz de se sobrepor a realidade empírica, foi desenvolvida pela
tradição platônica e serviu de preparação ao advento da teologia cristã. Platão falava a respeito
da realidade essencial, de idéias (ou=sia) como verdadeiras essências das coisas. Ao mesmo tempo encontramos em
Platão, e até mesmo mais incisivamente no platonismo posterior e no
neoplatonismo, forte tendência para a desvalorização da existência. O mundo
material não possuía valor real em comparação com o mundo essencial.
Para Platão o objetivo interior da
existência humana era descrito como se tornar semelhante a Deus tanto quanto
possível. Deus é a esfera da realidade espiritual. O te,loj (“alvo”, “propósito”) interior da existência humana
realiza-se na participação nessa esfera espiritual e divina, na medida do
possível.
Essa mesma idéia de tradição platônica reaparece especialmente nos escritos dos
pais capadócios da igreja para descrever o alvo supremo da existência humana. A
queda da alma da eterna participação do mundo essencial ou espiritual. Sua
degradação terrena num corpo físico, que procura se livrar da escravidão desse
corpo, para finalmente se elevar acima do mundo material. O processo seria
vagaroso e por etapas. Essas idéias aparecem também na Igreja, não apenas entre
os místicos cristãos, mas também no ensino oficial dos pais da Igreja.
A idéia da providência. Estamos acostumados a
pensar que essa idéia é cristã, mas, na verdade, já havia sido formulada por
Platão nos seus últimos escritos. Tinha o ambicioso propósito de acabar com a angústia do destino e da
morte na presente época. O sentimento de angústia em face do acidental e do necessário, ou
destino, representados pelas divindades gregas Tyché e Haimarmene,
era muito forte no mundo antigo. Em Romanos 8, onde encontramos o maior hino de
triunfo do Novo Testamento, lemos que Cristo tem a função de subjugar as forças
demoníacas do destino. Ao
antecipar essa situação, por meio de sua doutrina da providência, Platão fez
enorme contribuição à teologia. A providência, emanada do mais alto dos deuses,
dá-nos a coragem para escapar das vicissitudes do destino.
O divino é forma sem
matéria, perfeito em si mesmo (pensamento Aristotélico). É a idéia mais
profunda de Aristóteles. Deus, a forma mais perfeita, movimenta o mundo, não
casualmente empurrando-o de fora, mas atraindo todas as coisas finitas para si
mesmo, por meio do amor. Apesar de sua atitude aparentemente científica sobre a
realidade, Aristóteles desenvolveu um dos mais importantes sistemas de amor.
Entendia que Deus, a forma suprema, ou ato puro (actus purus), como o
chamava, move todas as coisas ao ser amado por todas as coisas. A realidade
toda deseja se unir à forma suprema, para se livrar das formas inferiores em
que vive, na escravidão da matéria. Mais tarde, o Deus aristotélico, forma
suprema, entrou na teologia cristã e exerceu tremenda influência sobre ela.
Estoicismo.
Os estóicos foram mais
importantes do que Platão e Aristóteles juntos para a vida e o destino do mundo
antigo. As vidas das pessoas educadas nessa época eram moldadas principalmente
pela tradição estóica. O
cristianismo tomou de seu rival muitas idéias fundamentais.
A primeira, a doutrina do Lo,goj, doutrina que pode desesperar muita gente quando
começa a estudar a história do pensamento trinitário cristológico. Lo,goj significa “palavra”, mas também se refere ao
sentido da palavra, a estrutura racional indicada por ela. Portanto, também pode
significar a lei universal da realidade. Heráclito pensava assim, foi ele o
primeiro a empregar esse termo filosoficamente. Para ele, Lo,goj era a lei determinante
dos movimentos da realidade.
Para os estóicos Lo,goj era o poder divino
presente na realidade toda. Podemos verificar três aspectos desse pensamento,
muito importantes nos desenvolvimentos doutrinários posteriores. No primeiro Lo,goj significa a lei da
natureza. Lo,goj é o princípio determinante
do movimento de todas as coisas. É semente divina, o poder divino criador, que faz com que as coisas sejam
o que são. É o poder criativo do movimento de todas as coisas.
No segundo aspecto
Lo,goj significa lei moral.
Podemos chamá-lo como Kant, de “razão prática”,
a lei inata em todos os seres humanos que se aceitam como
personalidade, com a dignidade e a grandeza do ser humano.
No terceiro, Lo,goj significa a capacidade humana de reconhecer a
realidade. É o que se pode chamar de “razão teórica”. Trata-se da capacidade
humana da razão. Tendo o Lo,goj em si, o homem também pode
descobri-lo na natureza e na história. Para o estoicismo, decorre daí a idéia
de que os seres humanos quando determinados pela lei natural, pelo Logos,
tornam-se lo,gikoj, sábios. Os estóicos não acreditavam que
todas as pessoas fossem sábias (não eram otimistas), poucas pessoas alcançavam
tal excelência.
O estoicismo professava um
pessimismo fundamental a respeito da maioria dos seres humanos. Originalmente,
os estóicos eram gregos. Mais tarde foram também romanos, entre os mais famosos
contam-se importantes imperadores, como Marco Aurélio. Esses aplicavam o
conceito do Lo,goj à situação política sob
sua responsabilidade. A lei natural significava que todos os seres humanos
participam na razão em virtude desse simples fato de serem humanos. A partir
desse princípio criaram leis grandemente superiores às muitas que encontramos
na Idade Média cristã. Concederam cidadania universal a qualquer pessoa que o
quisesse porque eram participantes em potência na razão. Naturalmente, não acreditavam que
todo o mundo usasse adequadamente a razão, mas entendiam que por meio da
educação todos poderiam usá-la um dia.
A segunda idéia
desenvolvida foi a igualdade entre todos os seres humanos. A concessão de
cidadania romana a todos os cidadãos das nações conquistadas representou
tremendo avanço nivelador. As mulheres, os escravos e as crianças, considerados
inferiores sob a antiga lei romana, tornavam-se iguais perante as leis dos
imperadores romanos. Não foram os cristãos que inventaram essas coisas, mas os
estóicos, por acreditarem na idéia de que todos participam do Lo,goj universal.
O cristianismo mantém essa
mesma idéia em base diferente: todos os seres humanos são filhos de Deus Pai. A
diferença é que os estóicos não tinham o conceito de pecado, falavam de
insensatez, mas não em pecado. A salvação se alcançava por meio da sabedoria;
no cristianismo, a salvação nos é concedida pela graça divina.
Ecletismo.
A Igreja cristã absorveu
também o ecletismo. A
origem do termo vem do grego e quer dizer escolher algumas possibilidades entre
muitas. Os
ecléticos não eram filósofos criativos como os antigos filósofos gregos. Esses
pensadores romanos combinavam, em geral, a política com preocupações sobre o
Estado.
Enquanto ecléticos não
criaram novos sistemas. Em vez disso, escolheram (Cícero, por exemplo) os
conceitos mais importantes dos sistemas clássicos gregos que lhes pareciam
pragmaticamente úteis para os cidadãos romanos. Escolheram o que poderia
produzir o melhor modo de vida possível para os cidadãos romanos, enquanto
cidadãos do mundo.
Principais idéias selecionadas por eles
(retomadas pelo iluminismo no século XVIII): a) Providência, porque dava segurança à vida do povo; b) Deus, por ser inata em todos, induzindo o temor de Deus
e à disciplina; c) Liberdade
moral e responsabilidade, possibilitando a educação do povo e tornando o povo
resistente diante das falhas morais; d) Imortalidade, capaz de ameaçar com a punição em
outro mundo os que escapavam do castigo aqui na terra. Essas idéias todas
também prepararam de certa forma o mundo antigo para o cristianismo.